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23 março, 2014

Perdão

atiro feito-me temor sagaz
sou como quem sente
e sinto muito, sou tão nada
nos tremores já me abismo
feito queda, pesar e o passar
da vida e dos dias que não,
sim, se vão...

tarde é sempre a hora
da razão de se encontrar
ou pesar de existir.

e peço perdão
confundi os dias.

21 março, 2014

Chuva negra

um dia seremos a carne que arrepia
a navalha que corta à cicatrizar
o fruto dessa rua quase terapia
e hoje inflamamos o bem-estar.

que as nuvens negras tragam em si
a bandeira hasteada em nome próprio
nenhuma outra voz falará por nós
nenhuma outra ideia será nós
Céu algum será o limite d'nossa luta.
Na labuta, na esquina e na rua
mãos vis armam-se de amor e guerra.

cada gota que tocar o solo
será irmão, irmã e mão
toda vontade se torna agir
e todo o querer ação!

de canhão ao palácio
até que tudo seja margem.
E então seremos todos,
seremos nós, seremos heróis.

16 março, 2014

Palavra sem dono

O que escrevo não é meu,
é teu, é de quem lê.
Se perguntarem-te
diga que sim, diga
àqueles que erguem
palanques, pontes e estátuas
em nome de si;
diga que sim, fosses tu
tu escreveste, diga que és poeta
diga o que disser que há.

Haja o que estiver sendo hora.

dos vermes que apimentam
a própria língua, da frustração de si
apenas pra cuspir em quem passa
em quem é sendo o que há.
Da corja quero olhar torto,
quero vento que passe e carregue.
Mas de ti que ficou até aqui
se pra ficar fôr que fique.
Assinado eu.

13 março, 2014

Eu, meu devorador

Como pude ser o que sou como sempre, às vezes humano e sempre meio lobo. Meio sujo, vulgo e perdão por diferir de todas as máscaras que pintaram em minha face. Repito as frases, as rimas, os passos e as desculpas. Que será de mim sem minha metade de mim mesmo. Hoje amo a todos, e nunca mais amei como aos poucos em outrora. Do remorso da paixão, à fria sensação da podridão. Como esgoto que escorre junto as vielas deixadas pelo capital. A herança de um filho bastardo, de deuses do todo sempre. Do poder centralizante como forma ilusionada de harmonia. Os pecados do corpo pulsante, toda a culpa e vergonha fizeram de nós nossos próprios lobos. Caçávamos a nós mesmos, como cão que não reconhece a própria calda. Esquecemos nossa extensão, pois nos deslocaram do mundo. Fizemos de nosso intelecto motivo de louvor a si mesmo. Quem há de devolver à lama o que lhe pertence? O pedestal que erguemos sob o nome de "homem", o deus que cultuamos sob forma de "ego", o autoritarismo que defendemos como sinônimo de "estado" e toda forma de opressão vista como natural. Caçamos-nos a si e a cada igual. Assistimos pela tela, com a educação de um bom espectador. Assim agrilhoamos a nós mesmos, sob correntes invisíveis criadas pela imagem de escassez.

08 março, 2014

A sangue e fogo

Vai, segue teu rumo. Sempre avante!
Que grilhão nenhum aprisione teus sonhos.
Que boca nenhuma lhe diga teu caminho.
Pois não se controla a força de quem luta,
e esta luta é tua, mulher.

Incendiar sutiãs, e corações
afundar metrópoles, tronos e reis.
para que todas escutem as canções
que talham a liberdade multicolorida.

A beleza está na bandeira que hasteias,
negra e sem a direção imposta
dos que não conhecem o teu sofrer.
Esta arma que carregas em teu peito
explodindo feito napalm
arde em chama eterna.
De história, luta e glória.

05 março, 2014

Do tempo em que fui o vencedor mais derrotado

quantas vezes já fiz poesia sem escrever, pendendo letra por letra a cada passo que passou. E assim como as nuvens eu passei; passei pela rosa morta caída ao chão, passei pelos ponteiros que contavam o tempo que nunca finda. Passei pelos troféus que enterrei ao longo destes passos...

E carregado chovo; como choro de quem sente, como pigarro de quem mente, soluço de quem se engasga na tempestade. Fiz-me água e escorro enquanto morro. Transbordo pelos mares, açudes, rios e mangues. Trago em mim o gosto da vida morta, o desprezo pela carne que sangra enquanto goza. E ainda em minha saliva se pode sentir o amargo da derrota.
 
 
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