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31 outubro, 2013

Amor y liberdad

Amei-a, como se nunca a tivesse conhecido. De fato é isto. Do já sabido só me inspira o tédio. Amei-a, por ser momento, ser breve. Não deve-se saber apenas chegar, mas também a partir. E amo quem parte na hora certa. Amo quem percebe que já não amo, mas então continuo a amar-lhe ainda mais por isso. E como tal amor, não pode ser outra coisa se não livre, não há contradição no que digo. Te amo, e vá-te logo. Tenho ainda tantas coisas para amar, como um colecionador de momentos, pois quando isso eu não mais puder, tornar-me-ei arqueólogo da memória, de meus vividos. Quando não mais puder amar pessoas, enamorarei cada instante, cada falta e cada solidão. No sótão de meu eu, pertenço-me mais que tudo, e apenas de mim serei escravo. Pois amo, e sou livre, acima de tudo, livre para amar todos.

26 outubro, 2013

em que esquina perdi minha direção
em que árvore esgotei o assunto
bem lá no fundo, é tudo ilusão.

16 outubro, 2013

O ego e o reflexo

É só outro dia que chegar em casa é sempre a mesma coisa, a mesma xícara de café de duas semanas atrás ainda em cima da mesa, fedor de mofo e um resquício de incenso, que disseram ser feito de adubo. Tem pequeninos insetos cortando meu olhar sobre o monitor, dançando pelo quarto por causa das cascas de frutas no lixeiro que nunca teve tampa. Há uma pilha de desenhos e quadros, ao lado da pilha de livros que se estende sobre a cama com um xerox do Derrida, o livro mais chamativo do Leminski e um lembrete de um compromisso para amanhã. Sacar dinheiro para pagar o aluguel, pagar este quarto mofado mais morto que minhas esperanças de algo promissor em qualquer caminho da minha vida, não sei bem os rumos que tomei, nem mesmo se já tomei algum, pela dúvida parece realmente que não. E está longe disso acontecer, são tantas desventuras e pensamentos medrosos para conseguir firmar o próximo passo, atolado sempre mais nesse lodo, perdendo-se nos devaneios e máscaras, desfilando de salto na passarela da esfera social. Estou farto, demasiado farto. Já não posso mais desviar de tantos dedos, já não consigo ver beleza nessas faces cansadas, tanto quanto eu, de continuar sendo outra coisa que não si mesmo. "Em que espelho ficou perdida a minha face", em que segundo ficou perdido os meus atos, em que ouvido ficou perdida minhas palavras, em que pensamentos me perdi? É tão longe de casa, mais longe do que se possa imaginar, como seria voltar? Como seria mudar? Como seria descobrir o que sou... Cada dia que passa, é apenas outro dia passado, e se penso no passado é difícil lembrar como eu tenho passado todos esses dias, até agora. Não sei como ainda mantenho-me andando, apontando o pé à direção alguma, sem conseguir falar para metade das pessoas que conheço; como estou de saco cheio delas. Errei o rumo, me perdi do mundo e se me abrigo aqui é apenas por vaidade. Vejo o reflexo no espelho deste rosto triste e sem expressão, fito-o por alguns segundos, essa face me é peculiar, parece comigo, mas já nem sei mais como me pareço.

09 outubro, 2013

Sobre aprender a morrer

Nem sei bem como começar, acho que ninguém sabe como começa uma história lamentável, a verdade é que essa história pode nem ser real. É o tipo de coisa que se pensa quando senta em uma mesa de cafeteria, sozinho, mas nunca se está realmente só. As pessoas olham, nunca trocam sorrisos, e há sempre algum cretino na mesa ao lado com ideias do século passado, e na mesa da frente, e na cafeteria inteira. Conheço pessoas cretinas que eu nem conheço, irônico e contraditório, que até soa verdadeiro, e talvez seja. Ou talvez seja apenas capricho meu, a verdade é que nem gosto tanto de café, mas cafeteria é um bom lugar pra se sentir bem, afinal, é o lugar com mais pessoas tristes por metro quadrado, até mais que num enterro. A tristeza das cafeterias é legítima, a de enterro é apenas pose, para continuar a se sentir humano, mas a quem queremos enganar, lágrimas não representam nada, a dor vem de dentro, vem de lugar nenhum, de um vazio quase infinito que se esvai em acordeões toda vez que ousamos ver além. E quão longe é esse além onde descansa uma alma morta, onde a primavera é eterna e onde as pessoas trocam sorrisos. Em que lugar da terra fica a bondade?
     Meu vazio me engole e suplica por uma cafeteria aberta às duas horas da manhã, e um pai a qualquer estação do ano.


01 outubro, 2013

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abre aspas

          não é estranho
          conseguir ser
          exatamente
          o que somos?
          ou ainda nem fomos
          nada

fecha aspas


 
 
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