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26 dezembro, 2013

(Epílogo)

partirei
só pra ver quanto tempo
o sol demora pra me atingir
seguirei, passo por passo
minha própria sombra
só pra ver até onde
a escuridão me leva
já que sem luz divina
Scorpius me carrega
em garras e me leva
para além do dia
em que ela não dirá
"Boa noite;
nos vimos, sem nem
viver os mesmos dias."
Mas tua luz chegou,
então pude continuar
seguindo minha sombra.
próximo capítulo...

25 dezembro, 2013

Entre o fim em si mesmo e o eterno retorno

É sempre um desafio. A primeira linha, a primeira palavra, o primeiro beijo. Mas a noite, ésta é sempre a primeira, de cada dia, e parece a primeira da vida. É onde me encontro, onde te encontro, porque sei muito bem onde estou, mas, nem tão certo de quem sou. - Amanhã acordei outro. - Colocaria o melhor disco pra tocar esta noite, mas não tenho nenhum LP, nem mesmo um toca disco. Minhas músicas guardo num hard disk desde os 14 anos. Eu até deletaria algumas se ocupassem espaço, mas esta coisa de bytes, isso nem existe de fato. A verdade é que devo ainda guardar todas as minhas músicas favoritas na mente. Eu poderia pô-las todas em tablaturas, mas não sei nada de música, a não ser, ouvi-las. Não confio muito em quem não gosta de Smiths, e muito menos, em quem começa a curtir depois de ter me conhecido. Há certas coisas que são necessárias a priori. Sabe, não precisa amar, nem dançar com um galho no bolso traseiro. Porque se não é o amor que nos manterá junto, a lembrança vai. E ah! Como eu queria matá-las! Mas a lembrança é um gato radioativo de Tokyo. Ela tem sete vidas, multiplicadas por sete milhões. É um zumbi que lhe come o cérebro até você já não mais aguentar, até se render, e andar com as feridas expostas. A felicidade vem como a melhor coisa que pudera ter acontecido, vem com sorriso falso e as mãos escondidas. Ela te arrasta pro inferno apenas por não ter notado seu novo corte de cabelo. Ah, a felicidade... de nada te ensina, te sufoca e te domina. Se apresenta como um sopro leve, você inspira o ar, e ela vai embora antes que termines de piscar os olhos.
      Sou clandestino, e adoraria me apaixonar... se meu amor não tivesse num coma... minha vida é como luz de estrela, esta aqui, mas acho que já passou, e eu nem notei quando morri. Quem sabe aos poucos, a cada beijo dado, a cada olhar desviado, a cada gozo sem amor, a cada papo furado, ou silêncio quilométrico. Foi assim que morri... tirando meu eu de mim, negando que eu poderia me ser uma boa companhia. Não sei mais em que esquina encontro os restos que sobrou do que eu era.
     Os dias passam, e são sempre outros, mas porque há coisas que não mudam? Ah, dayana, as noites sempre me trazem um pouco do que fomos, e ainda deve ter algum fio de cabelo loiro em alguma roupa que ainda uso desde quatro anos atrás. Pois continuo o mesmo garoto que você um dia amou tanto e escuto as mesmas músicas da minha adolescência. 

17 dezembro, 2013

Feliz natal, disseram eles...

    Há nas ruas sempre um pouco de tristeza, outro tanto de poesia. Principalmente nesta época, o natal. Famílias saindo pra comprar presentes pra parentes odiosos, onde calculam o quanto se amam, pelo quanto vale o que está embrulhado por um papel asqueroso. Essas decorações deviam ser todas azuis, pra combinar com esse 'livre-mercado', liberalismo desenfreado e assassino. Mas acho que deve ser vermelho apenas pra representar o sangue dos 'duendes' explorados, que ninguém nunca vê. E como diz a história, moram lá no polo norte, também conhecido como subúrbios ou favelas. Bem longe dos sorrisos falsos que habitam os centros comerciais. Há tempos tenho deixado essas coisas de lado, essa solidariedade só de fim de ano, os presentes industriais. Consumimos tanto, que nem sabemos pra onde vai, de onde vem. Nunca vemos além, além dos produtos, além das lojas, além dos rostos cansados de se fazerem simpáticos pra vender a mesma merda todo dia. Não há satisfação em ter dono, não há vida em ter patrão - submissão é morte, rebeldia é vida - Mas como? Te ensinaram assim, a ser assim. Ensinaram aos seus pais assim, aos seus avós. E aos pais de seus avós. Como lutar? Como resistir? Nos roubaram a vara, o peixe, o mar, as estrelas e os sonhos. Restou-nos instituições podadoras de diversidade, de criatividade. Nos empurraram mil e uma coisas iguais, com embalagens diferentes, e dizem que ISSO é ter escolha. Nos forçaram a aceitar isso, e nem ousaram nos consultar - aliás - eles nem sabem da nossa existência. Conhecem-nos só como pesquisa, como dados. Não me perguntaram o que quero, me disseram o que querer. Não me perguntaram o que sinto, me disseram o que sentir. Ninguém nunca quer saber dos problemas alheios. Eu até entendo, já estamos todos atolados na merda, quem afinal, quer mais merda para se cobrir?
      Mas há sempre um breve vento, uma brisa, que seja! Vem do sul, em direção ao norte. Sempre há um pedacinho de nós que sabe pra onde ir. Sabe onde há um porto seguro. Nós só não sabemos como faz pra atravessar esta areia movediça entre o céu e o inferno. Vejo uma garotinha no colo de sua mãe, está no banco a minha frente. Eu diria no máximo uns quatro anos, cabelo encaracolado, loira, branquela. Talvez uma futura fascista, uma médica, uma atendente daquele bar de esquina que tem sinuca e os salgadinhos mais gordurosos do bairro. Talvez uma futura prostituta, ou morra antes da primeira menstruação. Quem sabe? Ninguém. Ninguém nunca sabe o que essas crianças serão. E na infinita possibilidade, sabemos que será corrompida, por essa lógica neoliberal, essa falsa escassez de dinheiro, essa falsa liberdade de escolha. Essa competição que nunca cessa, e não se vê um único dia de plenitude, de ajuda e cooperação. Não se vê uma mão estendida que não seja pra te pegar pelos cabelos e te jogar no fundo do poço, cada vez mais, te usando de andaime.
     Mas por mais perdido que eu esteja, sei que não é este o meu norte, e sim o meu sul. É o que deve ficar pra trás, deve ser superado. Posso não saber pra onde ir, mas sei muito bem onde não quero estar. E por todas as crianças do campo, por todo pobre morto pela polícia, por todo índio tirado de suas terras, por todo negro que estava no lugar errado, na hora errada, por toda mulher violentada, por todo animal dilacerado, por todo rebelde preso porque, assim como eu, cansou de submissão:
    Jamais regrediremos um passo, até que todo 'duende' esteja sem grilhões em suas pernas, e em suas mentes. Até que todo sopro de esperança leve consigo a resignação.

Cada célula somos

sinto-me indo, avante
além do que me cerca
destruir estes grilhões
que nasceram fundidos
a minhas pernas

é preciso.

Resistir, com arco
com flecha, com o coração
com canhão

destruir

me encontrar todo dia
afirmar que sou
tudo isso e seu contrário
sou a dialética negativa
a negatividade do saldo

o anti-cristo
o soldado
pronto pra morrer
por nação alguma.

Sou a negação do massacre,
das hierarquias
da poesia oprimida.
Sou o todo e as partes,
somos.
a célula geral
o geral individual
e não deixo jamais
de ser-me.

tanto quanto sou-te
pois cada alma livre
que dança nos abismos
afirma que sou
cada vez mais livre
quanto mais livre
fores vós.

 
 
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